Há vírus sobre nós

Janeiro quase findo. Chuvas dão trégua, mas o estrago foi grande. Famílias perderam tudo ou quase. Prédios históricos foram engolidos por encosta deslizada.                                             Está quente, muito quente e abafado. Poucos carros na rodovia nesse sábado. Urubus e pássaros voam num céu azul intenso. Canário chapinha canta sobre a ponta do telhado do vizinho, afinadíssimo. Olha pra mim, sensibilizado com meus espirros e fungações contínuos. Ele sabe do meu desconforto. Vegetação baila no ritmo do vento. Ora brisa, ora vento. Raios solares intensos; prefiro a bruma. Gripe leve se arrasta há dias. Dor no corpo, nariz entupido, coceira na garganta, coriza e espirros. Não me enveredei pelo “acho que é uma gripe ou um resfriado”; fiz o teste depois de três dias de sintomas: reagente… Janeiro branco. Cuido de minha saúde mental diariamente.

Pouco se fala sobre “Janeiro Branco”. Eu sei, é difícil ouvir os queixumes de um deprimido. Quem anda pela depressão sabe do mal avassalador dessa doença. Música ao longe, óleo de lavanda, ioga, caminhada, meditação, leitura, arte-terapia, terapia, chás de erva-cidreira, camomila e antidepressivos. Uma nova onda de COVID-19 nos aguarda.                                                                 O nível de transmissibilidade da Ômicron é esmagador. Jota late para o motoqueiro que deixa os remédios na mesa da área de casa. Distanciamento de 2 metros, peço ao rapaz. Aviso que estou infectada. O moço não tem medo, dá de ombros e rebate: sou jovem… Estamos vivendo um cenário de medo há tanto tempo, que o medo de se infectar tornou-se banal, a COVID-19 tornou-se: banalidade.                                                                Não sei o que seria de mim se não fosse a vacina. Falta de ar, intubação, complicações e óbito; ou sequelas graves? Sem neurose, drama ou afetação, passo pelos sintomas da gripe, sem ataques de pânico e ansiedade. Talvez, quem sabe, seja essa a “gripezinha” que o governante mencionou no início da pandemia. Depois de devidamente vacinados, talvez venha a ser uma gripezinha. Gripezinha que arrebenta o corpo! De medicina sei tanto quanto sei de física quântica: NADA. Tomei três doses da vacina, tomei os cuidados necessários, usei máscara na rua, nos ambientes fechados e abertos. Respeitei o distanciamento.                                                              Não sei o momento ou a circunstância da infecção. Um vacilo, evidentemente. Tomei três doses. Repito pra mim: três doses da vacina; para não entrar em pânico, repito: três doses. Boca seca, apetite diminuído. Nunca olhei para um pedaço de bolo com in-diferença e má vontade. Quando vejo doce, ele sacode minha gula. Quem sabe permaneça com essa desmotivação? Para um diabético, sucumbir à gula por doces é um mal danado à saúde.                                          Maritacas em parlamento chamam atenção; cantam sobre as janelas. Latido de cachorro e som de alguns veículos na rodovia. Uma ambulância corta dois carros. Veloz e contínua. Mais um enfermo?                                                    Perguntaram-me que livro estou lendo. Autoajuda, de Brené Brown. Não tenho problema algum em dizer que leio, autoajuda. Capítulo: não somos durões. “Para mim, uma pessoa durona é aquela que diz: Nossa família está sofrendo muito. A sua ajuda é importante. Ou o homem que diz ao filho: Não faz mal ficar triste. Todo mundo fica triste. Só precisamos conversar. E a mulher que diz: Nossa equipe deixou a peteca cair. Precisamos parar de jogar a culpa uns nos outros e ter uma conversa difícil sobre o que aconteceu para podermos corrigir o problema e seguir em frente.

Durões são aqueles que enfrentam o desconforto e a vulnerabilidade e dizem a verdade sobre a própria história”. É isto que a autora, primeiro lugar na lista do The New York Times, diz. O livro aborda mensagens de encorajamento, aceitação, esperança e vulnerabilidade. Leitura indicada para os que sofrem de tristezas leves, agudas ou especialistas em saúde mental… Os hospitais co-meçam a ficar lotados. É gente com COVID-19 ou H3N2. Passamos por males de diversas ordens. A vida nunca girou em torno do nosso umbigo, nem de nossas teimosias, vaidades, vontades ou desejos. Nós é que giramos em torno da vida. Copérnico mostrou que a Terra é que se move em torno do sol. A lua, as estrelas e o sol nunca se moveram em torno da terra. Nossa vida é que gira em torno da existência ou nós é que giramos em torno da vida. Parece um comentário vulnerável. E é mesmo. “Vulnerabilidade não é ganhar ou perder; é ter coragem de se mostrar e ser visto quando não se tem controle algum sobre o resultado. Vulnerabilidade não é fraqueza, mas, sim, nossa maior medida da coragem”. (BROWN). Estamos vulneráveis, tristes. Precisamos de ajuda, de menos descaso das autoridades e mais caso e carinho dos nossos familiares. Estamos girando em torno da morte, do negacionismo, das brigas, das querelas, da inapetência, da desordem, da maldade, da in-veja… Mas também estamos girando em torno de atos solidários, de demonstrações de carinho, amor ao próximo, cuidado, gentilezas… Eu preciso da ajuda do outro, você precisa da ajuda do outro; pedir e receber ajuda não é fraqueza, é força, extrema força e desejo de superar obstáculos, vencer batalhas em que grande maioria sabe que juntos somos capazes de driblar esse vírus maldito, que ceifou e ceifará vidas…                                        Não temos controle de nada. Por enquanto, só sabemos que há vírus sobre nós!

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*** Andreia Donadon (Mariana-MG): Mestre em Literatura,  Doutoranda em Educação.  Membro da Academia Marianense de Letras,  da AMULMIG e da ALACIB-MARIA-NA. 17 livros editados.

Colunista do jornal TEMPOÉTICA (Itabira/MG), jornal Notícias de São Gonçalo e região ( São Gonçalo do Rio Abaixo/MG) e também do jornal , JB JORNAL DE BARÃO (Barão de Cocais/MG),        PORTAIS ELETRÔNICOS: www. jornaltempoe tica.com.br/www. jbjornaldebarao. com.br / www. jor naldesaogoncalo.com.br
Panfletu’s,  Agência Primaz de Comunicação.  Cola-boradora do Linguagem Viva  – São Paulo.